Taxação de ‘super-ricos’ só será eficaz se tiver adesão global, diz embaixador Maurício Lyrio
A taxação de grandes fortunas, proposta capitaneada pelo Brasil na presidência rotativa do G20 neste ano, depende de adesão em escala global para que seja bem-sucedida, avalia o embaixador Maurício Lyrio, secretário de Assuntos Econômicos e Financeiros do Ministério das Relações Exteriores e Sherpa do G20 no Brasil, emissário pessoal do governo que lidera as negociações.
Embaixador Maurício Lyrio, sherpa do G20 no Brasil | Foto: Julio César Guimarães
Lyrio, que participou nesta segunda-feira (1º) das discussões do Science 20 (S20), no Rio, também falou ao Valor sobre as propostas relacionadas a temas de transição energética, mudança climática, troca de dívidas e combate à fome — este um tema prioritário do Brasil no grupo com as maiores economias do mundo.
De acordo com o embaixador, o governo propõe dar continuidade ao debate iniciado em 2021, quando o G20, em um acordo vinculante com a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), construiu a chamada “Solução de Dois Pilares”, que busca direcionar melhor a taxação das empresas multinacionais nos seus vários mercados.
O Pilar 1 prevê que parte do lucros das multinacionais fique na jurisdição de mercado onde a empresa realiza os lucros, enquanto o Pilar 2 estabelece uma tributação de 15% para as suas operações globais. Agora, a busca do governo brasileiro é por um novo pilar.
O Ministério da Fazenda, por meio do ministro Fernando Haddad, à frente da Trilha Financeira do G20, contratou o economista francês e professor da Universidade da Califórnia, Gabriel Zucman, para elaborar um estudo que avança no acordo vinculante já em prática e propõe a taxação de 2% sobre grandes fortunas.
Segundo o relatório, há cerca de 2 mil a 3 mil “super-ricos” no mundo, e um acordo global entre todos os países faria com que a tributação desses bilionários gerasse de US$ 200 bilhões até US$ 250 bilhões por ano.
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Com as contribuições da economista francesa Esther Duflo, laureada com o Nobel da Economia em 2019, vem sendo discutida acriação de um fundo de adaptação de mudanças climáticas, cujos recursos seriam transferidos de forma direta às pessoas em países afetados por eventos climáticos extremos.
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Aliança Global contra a Fome
Como principal atuação do Brasil no G20, o embaixador destacou a “Aliança Global contra a Fome”, que tem base em três pilares: o Pilar Autônomo, pelo qual os países que quiserem aderir devem escolher um programa social dentro de uma cesta de opções para implementar em âmbito doméstico.
A aliança também terá um Pilar Financeiro, que estabelecerá mecanismos para que os países que integrem a iniciativa tenham acesso a recursos de organismos internacionais, doações privadas e de outras nações. Neste pilar, o Brasil defende a troca de dívidas, isto que, que os países endividados possam renegociar com seu credor se assumirem o compromisso de realocar o dinheiro em programas sociais.
Por fim, há o Pilar de Conhecimento e Cooperação. A ideia é que países que têm boas experiências em políticas públicas de combate à fome deem assistência técnica a outras nações.
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“Desde o ano passado, o presidente orientou que queria reforçar a interlocução do ‘G20 governo’ com o ‘G20 sociedade civil’. Antes era uma relação informal, nós institucionalizamos isso. Não é pro-forma, não é receber na véspera quando a Declaração já está negociada, queremos uma contribuição real”, destacou o embaixador. “A capacidade dos mais diversos grupos de chamar atenção para temas que os líderes deveriam olhar é algo que consideramos muito importante”.